Nem tanto ao céu nem tanto ao mar (filosofando sobre o vinho).

John Bender, doutor em filosofia pela Universidade de Harvard e experiente juiz em competições de vinhos, escreve um dos capítulos do livro organizado por Fritz Allhoff, Wine and Philosophy (Blackwell, 2008).

Em What the Wine Critic Tells Us (em tradução livre, O que a Crítica de Vinhos nos Informa), Bender transita entre os critérios objetivos e subjetivos da crítica, ou seja, ele tenta estabelecer quais são os aspectos objetivos e subjetivos aos quais os degustadores de vinhos estão sujeitos, sejam eles profissionais ou não.

A primeira estaca fincada por Bender diz respeito ao que se entende por subjetivo; o termo equivale a aspectos inerentes à atividade intelectual em torno da degustação, ao julgamento e à forma de comunicar as impressões sobre um determinado vinho.

Segundo Bender, não é subjetivo encontrar determinadas características de aromas, texturas e sabores específicos nos vinhos, pois são decorrentes de transformações fisicoquímicas sofridas ao longo do processo de produção e envelhecimento da bebida.

Por outro lado, é subjetivo fazer uso de metáforas para remeter a estas características. Ou seja, perceber no vinho aromas de frutas, flores e especiarias, como cravo e pimenta do reino, dentre tantos outros, são explicáveis à luz da química e podem ser detectados tanto por exames laboratoriais que isolam as cadeias de elementos químicos na bebida quanto através de exames olfativos levados a cabo por degustadores.

Estes são os aspectos objetivos do vinho. Todavia, associar a intensidade de um destes aspectos a paisagens, formas musicais, clássicos da pintura ou fazer uso de palavras como "vibrante" e "musculoso", entre tantas outras, faz parte dos aspectos subjetivos. Tais aspectos dizem respeito a experiências e repertórios individuais.

A passagem dos aspectos objetivos para as metáforas parece ser a chave do problema. Informar sobre os aromas que podem ser percebidos em certo vinho é parte da educação do paladar do consumidor.

Ele aprende com isso, o que abre as portas para que outras experiências sejam perseguidas. A vontade de reconhecer determinados aromas em outras amostras de vinho passa a fazer parte de sua viagem rumo aos prazeres da bebida.

Isso deve valer pra todos os níveis de consumidores, desde os que buscam vinhos mais simples para acompanhar a macarronada do almoço de domingo até os que selecionam rótulos mais exclusivos para jantares em restaurantes sofisticados.

A cada bolso um gosto, e não há qualquer demérito nisso. Ao tentar criar figuras de linguagem em torno das descrições mais objetivas, muitas vezes as metáforas utilizadas são tão próprias da memória e do universo pelo qual transita o crítico que o consumidor comum se vê afastado da possibilidade de fazer parte daquela experiência.

A questão não é a validade da metáfora enquanto tal, mas se ela de fato causa algum outro efeito no consumidor que não um sentimento de impotência diante do vinho.

Metáforas bem elaboradas, às vezes aparentemente simples, podem auxiliar um iniciante a entender o que significa determinada amostra de vinho em meio a tantas outras.

Metáforas por demais rebuscadas e herméticas podem afastar por completo o aprendiz da matéria em questão. Isto vale para vinhos, matemática ou filosofia, todo educador sabe.

Você agora deve estar se perguntando: bom, mas e aí? O que eu faço diante da carta de vinhos ou da prateleira de bebidas em lojas e supermercados? O que eu faço com o sommelier ou maître arrogante do início do texto?

A dica é: não recue, não se intimide. Pergunte. Procure auxílio e pergunte sempre ao sommelier ou atendente de vinhos. Não tema fazer perguntas sem sentido, pois todas elas têm sentido, ao menos para você que quer aprender.

Caso note um ar arrogante, abaixe ainda mais o nível das perguntas, e questione sobre coisas básicas e os termos que ele está usando para explicar determinado vinho.

Se for um bom profissional, ele encontrará a melhor forma de conduzir a explicação para que você entenda e opte com consciência. Se for um mal profissional, a arrogância saltará aos olhos, e você saberá que não adianta insistir.

Nesse caso, escolha sem seu auxilio, e busque prazer na aventura. Afinal, como marcou Bender em seu texto, a degustação é uma reação ao prazer causado pelo vinho, e atenção, experiência e memória são fundamentais para que o prazer do gole ocorra.

Não deixe que atrapalhem seu momento. Em tempo: tudo isso só é válido se você for um consumidor moderado, que consegue se manter atento e sóbrio durante suas degustações e conversas sobre o tema. Caso contrário, não gaste dinheiro com boa bebida!

Por: Carlos Alberto Barbosa (Terra)

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