De todos os sentidos, o olfato é o menos estudado. Foi só no início dos anos 2000 que dois cientistas americanos, Richard Axel e Linda B. Buck, descobriram a existência de uma grande família de genes responsável por cerca de 400 tipos de receptores olfativos. São esses receptores que mandam sinais para o cérebro, onde o cheiro é decodificado e identificado.
A descoberta rendeu o Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia de 2004 aos pesquisadores, mas o estudo não responde como esses receptores funcionam. Quanto à importância histórica, no entanto, não restam dúvidas. "De uma perspectiva evolutiva, o aroma foi importante para manter nossos ancestrais longe de ervas venenosas e evitar que comessem carne estragada", explica o neurocientista americano Charles J. Wysocki, do Monell Chemical Senses Center.O epitélio olfativo humano tem 20 milhões de células sensoriais, (poucas, comparadas ao canino, de 100 milhões). "Conseguimos discriminar milhares de aromas, mas nosso dicionário é fraco para definir o que estamos cheirando", diz Wysocki. / C.B.
Em entrevista ao Paladar, Moisés Galano, diretor de Criações e Aplicações para a América Latina da Givaudan, em São Paulo, fala sobre o aroma como ativador de memória, sua importância para o paladar e as novas pesquisas na área.
Qual a importância do aroma na comida e na bebida?
O aroma tem papel fundamental na aceitabilidade, através do aroma estimulam-se respostas emocionais e cognitivas de forma consciente e não consciente, despertando mecanismos de reconhecimentos e comportamentos que afetam a aceitabilidade da comida e bebida.
Quais são os ingredientes aromáticos ou realçadores de aromas?
O aroma é formado por uma combinação de moléculas e ingredientes, na grande maioria encontrados em alimentos na natureza, que possuem propriedades funcionais integradas para estimular os receptores olfativos e de sabor gerando uma mensagem ao cérebro que faz o reconhecimento "daquele" perfil de odor ou sabor, isto é, a percepção da fruta de morango, da baunilha ou do gosto doce do açúcar, gosto salgado do cloreto de sódio ou de realçadores do sabor umami que aumenta a palatabilidade e dá o toque "mais gostoso" em alimentos culinários. Usam-se ingredientes como óleos essenciais, extratos, moléculas naturais separadas ou sintetizadas, ingredientes naturais potencializados por biotecnologia e muitos outros ingredientes de propriedade intelectual da Givaudan.
Por que o aroma é um ativador de memória?
Durante nossa evolução desenvolvemos mecanismos de reconhecimento de odores e sabores (aromas), que hoje chamamos de sistemas sensoriais, que através do nariz e boca desenvolvem funções de reconhecimento e transmissão de informações olfativas e de sabor ao cérebro onde ocorre a decodificação e consequente interpretação do estimulo externo, que sabor?, que odor? que aroma? Além desse sistema extraordinário e das informações básicas (muitas vezes de sobrevivência) que herdamos, durante o ciclo da vida construímos experiências sensoriais que por sua vez também são identificadas e armazenadas no cérebro que guardam o resultado de tais experiências, positivas ou negativas, sendo que no momento que um aroma é experimentado e percebido ocorre todo processo do sistema sensorial, da recepção, identificação, decodificação e reconhecimento "daquele aroma" no cérebro que, por sua vez, poderá trazer o resultado perceptivo da experiência anterior, por exemplo: esse produto eu posso comer que não faz mal; esse produto me faz sentir muito bem como eu me sentia quando eu comia com meus avós; me faz acreditar que é um suco de laranja recém espremido; me conduz a lembranças da infância; etc. Pode-se dizer, então, que o aroma estimulou a memória.

Aroma x Sabor. Um depende do outro?
Pode-se dizer que são complementares e quando ambas categorias de receptores (do nariz e da boca) são estimuladas se dará uma experiência sensorial diferenciada e completa.
Como o homem percebe ou sente o aroma? Como funciona o olfato e sua importância na hora da alimentação?
O homem percebe o aroma através do sistema sensorial olfativo. O aroma é detectado no nariz, quando inalamos um aroma/odor as suas moléculas alcançam receptores olfativos localizados numa área interna do nariz chamada epitélio olfativo, as moléculas se ligam aos receptores que por sua vez estão presentes nos neurônios e esses fazem a ligação ao cérebro alcançando o bulbo olfativo cerebral e daí, por outros mecanismos, os sinais são transmitidos a outras regiões cerebrais que irão responder com a decodificação e o retorno da percepção que sentiremos. Dessa forma, na hora da alimentação o olfato atua com respostas em várias áreas de preparação para o homem se alimentar, no lado emocional, prazeroso de uma boa experiência anterior, à ativação de vários mecanismos fisiológicos que preparam o organismo para uma eficiente digestão.
Qual a contribuição dos chefs de cozinha para as pesquisas da Givaudan?
Os “chefs” são essenciais para nosso desenvolvimento, através da inspiração criativa para nossos aromistas e conceituais para nossos designers de produtos, por meio de combinações inovadoras de ingredientes que maximizam a percepção sensorial ou criam percepções diferentes e inovadoras, conceitos de pratos diferentes, uso de técnicas de preparação que alcançam notas e sabores diferenciadores, etc. Toda essa criatividade é canalizada para o desenvolvimento de aromas que levarão uma autenticidade cada vez maior aos pratos ou que levarão às opções diferenciadoras e de alta aceitabilidade pelos consumidores (inovação).
Quais as novas descobertas nesta área?
São muitas, como exemplos poderia citar o desenvolvimento de aromas autênticos que caracterizam processos de preparação na cozinha como guisado, assado em forno, rotisserie etc.
Quais os ingredientes que estão em teste ou que são a nova tendência?
As soluções aromatizantes da Givaudan para suportar o desenvolvimento de produtos saudáveis (saúde e bem-estar) tem alcançado alto nível de sucesso, auxiliando a indústria de alimentos e bebidas a lançarem produtos com alta aceitabilidade pelos consumidores.
Como as pessoas podem realçar um aroma ao cozinhar em casa? Ingredientes, essências...
Através do uso adequado de ervas e especiarias, do sal, de essências industrializadas próprias, de realçadores comerciais como "cubo de carne, galinha, vegetais, temperos e condimentos", através de processos de preparação, etc.
As pessoas sentem os aromas de maneira e intensidade diferentes?
Sim de uma maneira geral, pois as sensibilidades olfativa e de sabor estão alinhadas a fatores fisiológicos e também cognitivos, ou seja, depende muito da experiência adquirida também.
É possível exercitar ou treinar o nariz para identificar ou sentir melhor os aromas?
Sim. Primeiramente é importante desenvolver uma linguagem própria onde se estabelece vocabulário adequado, depois se faz o alinhamento dos termos do vocabulário com a percepção real e contínua com intensivo processo de experimentação em diferentes níveis de dificuldades.
Existe algum teste que a pessoa possa fazer em casa para exercitar ou treinar o nariz?
Sim e é muito gratificante. Sugiro começar com a conscientização da importância da percepção sensorial para o prazer da alimentação, com esse simples “despertar” faz com que as pessoas comecem a prestar mas atenção ao olfato e sabor e gradativamente vai se treinando na tentativa de identificar notas que fazem lembrar algo como, por exemplo, cebola, orégano, pimenta, leite, salgado, gorduroso, açucarado etc. Nessa fase não é necessário usar um vocabulário científico mas sim um reconhecimento de experiências passadas. Dando um passo mais a frente, sugerimos se dedicar a apreciação de vinhos, pois as notas são muitas, bem diversificadas e de concentrações variadas, no mercado se encontram facilmente listas de vocabulários e, com essas ferramentas básicas, se aprimora muito a percepção olfativa e de sabor.
O que os técnicos da Givaudan estão pesquisando sobre aroma?
As pesquisas são intensas e contínuas pois as experiências e expectativas dos consumidores e dos mercados são crescentes e demandam soluções aromáticas para as indústrias de alimentos e bebidas cada vez mais complexas, sendo as descobertas, o uso de alta tecnologias e conhecimentos inovadores em aromas fundamentais para o atendimento dessas necessidades. Assim, as pesquisas se concentram em várias áreas que vão dos estudos avançados dos mecanismos de percepção sensorial olfativo e sabor alinhados ao desenvolvimento de ingredientes inovadores para estimular as percepções dos sabores, tais como “doce, salgado, umami, etc.”; ao desenvolvimento de novas moléculas que estimulam o sistema sensorial olfativo e nos permitem alcançar uma autenticidade maior nos aromas, como de chocolate, baunilha, pêssego, menta. Ainda as pesquisas de novas tecnologias para sistemas de liberação aromática controlada no alimento e bebida final, como o aroma encapsulado numa matriz que libera o aroma num determinado tempo após início da mastigação, como chiclete ou durante o forneamento de um biscoito. E, por fim, as pesquisas de entendimento de consumidores que nos enriquecem com informações extraordinárias através de ferramentas e metodologias inovadoras.
Sem dúvida, o mundo dos Aromas é fascinante! Um universo fantástico onde, inúmeras moléculas combinadas reproduzem as propriedades sensoriais, gustativas e olfativas, de alimentos e bebidas. O uso, seguro e eficiente, destas moléculas, resultado da curiosidade humana, da evolução de nossos sentidos e alinhada com a evolução científica e tecnológica, possibilita a reprodução dos mais variados, comuns ou exóticos, e agradáveis sabores.
ResponderExcluirMassao Geraldo Alves - 15/02/11